sábado, julho 07, 2012

Ficção e História: Melhor Não Misturar

Assim como muito amantes da literatura sou fã dos romances históricos, mas desde que eles mantenham separados os limites entre ficção e história.

Muitos autores de romances históricos se empolgam e acabam por resolver enigmas históricos e criar personagens fictícios com envolvimento nos acontecimentos históricos a ponto de até alterá-los. Essa prática é, extremamente, perigosa no sentido de que com o tempo e o eventual sucesso mercadológico das obras literárias, essas criações passam a ser consideradas, pelos leigos, como história.


Um exemplo clássico, onde a literatura imita a vida fazendo com que um personagem inteiramente fictício assuma ares de realidade recebendo uma completo folclore no seu entorno é Drácula, de Bram Stocker. Depois da obra de Stocker, um mito restrito aos países nórdicos, com pouca penetração como os vampiros, se torna objeto de interesse de milhões de pessoas no mundo, que passam a assumir o personagem como real. Em seguida, as produções cinematográficas terminam o serviço com a criação do evangelho segundo os vampiros com a publicação de toda sorte de guias de proteção e maneiras de se lidar com o monstro, chegando mesmo a estabelecer um culto vampiresco.


Voltando à questão histórica, citamos um exemplo característico, relativo à saga de Alexandre o Grande, nos qual o autor ultrapassa os limites da liberdade poética interferindo nos acontecimentos históricos. Trata-se da renomada e consagrada escritora inglesa Mary Renault, que se especializou na reconstituição romanceada da vida e dos costumes da Grécia se notabilizando sempre por uma detalhada pesquisa em todos os seus romances. Na maioria dos seus livros sobre a vida e saga de Alexandre, Renault sempre deixou sua imaginação dar vazão a inúmeras especulações não-históricas. O ápice dessas especulações ela apresenta em seu livro "The Persian Boy" na qual a biografia de Alexandre é narrada por Bagoas, supostamente um dos amantes de Alexandre, oriundo da corte de Dario III.

Devido às escassas referências históricas que existem sobre Bagoas, Renault, obviamente, teve que enriquecer sua história através de sua própria imaginação, sugerindo até que esse viveu seus últimos dias em Alexandria para onde teria acompanhado o corpo de Alexandre e até sido instrumento no plano de Ptolomeu para sequestrar o corpo.

Evidentemente, a condição homossexual de Renault contribuiu para essa visão estereotipada de um Alexandre, anacronicamente, enxergado como homossexual, fato que jamais pode ser pesquisado de dentro das fontes primárias.

Esse tipo de atitude contamina, irremediavelmente, a história e cria narrativas paralelas sem qualquer historicidade, que se tornam tão importantes como a história verdadeira, mas que a distorcem e muitas vezes a denigrem.

Nenhum comentário: